A ILUSÃO DO PODER DO TRÁFICO
Eu nunca quis desembarcar neste planeta,
nunca quis renascer, principalmente na família em que nasci.
Porque esse Deus, que todos dizem
misericordioso, me faz nascer num lugar insalubre, com uma mãe solteira,
drogada e prostituta, que Ele ganha com isso? Será que é para me castigar, para
rir de mim?
Passei
uma infância triste, onde a fome foi minha companheira, o frio cortava minha
carne nas tristes noites de inverno e a solidão nunca me abandonou.
Que inveja eu sentia das pessoas que tinham
uma vida normal, era nessas horas que eu tinha mais rancor deste DEUS que todos
adoravam.
Aos
dez anos decidi sair de casa, afinal ficar nela ou não era a mesma coisa,
acabou quer fiz um favor a ela. Nas ruas, apesar de tudo era bem melhor que
aquele casebre em que vivia. Nas ruas aprendi a roubar, a traficar, passei a
ter muito mais que tinha lá no morro.
Nas ruas tornei-me um dos soldados do
tráfico, fui recrutado por um homem que me levou para uma comunidade para
proteger o império do chefe do morro. Confiaram a mim uma arma e um rádio,
aquilo me fez sentir grande, a partir daquele dia dediquei-me ao trabalho do
chefe e com isso matei muitos rivais, acertei contas e apaguei muito polícia.
De neguinho mimado do morro dos prazeres,
do esfomeado de ontem, tornei-me um dos gerentes e braço direito do patrão do
Nova Brasília. Passei a ser um homem
implacável, fiz de tudo que pode se imaginar. Fiz algo que pra uns seria
impensado, busquei aquela nega que um dia chamei de mãe e ali no morro tive o
prazer de estrangulá-la, foi a forma que tive para revidar tudo o que ela nunca
me deu.
Com a alucinação do poder que achava que
tinha, drogava-me cada dia mais, e mais atrocidade eu fazia. Meu nome era
conhecido em todo Rio
de Janeiro, era caçado por toda polícia.
Um
dia, durante o sono na casa de uma das minhas inúmeras amantes que tinha no
morro, uma operação policial tomou a casa em que estava e mesmo tendo me
rendido, fui brutalmente assassinando por um policial tão rude quanto eu. Pulei
sobre ele, mas não o atingi. Vi ali meu corpo caindo todo crivado de tiros e vi
uma horda (bando malfazejo) de desafetos que riam de mim e furiosamente caíram
sobre mim.
Fui
refém desta horda por um tempo que não sei precisar, fui seviciado de todas as
formas possíveis e os dias e noites nunca tinham fim.
Hoje não sei como, num atino de lucidez,
uma mão retirou-me daquela cela imunda e por uns momentos não sinto as dores
das constantes surras que levo.
Sei que não posso pedir nada, mas se
tivesse a chance de ter feito diferente, tenho certeza que aquele caminho de
ilusões eu nunca teria seguido, preferiria a fome e os frio do humilde barraco
do que a ilusão do poder do tráfico.
Sou um ser desprezível. Um assassino.
Willian.
Psicografia recebida em 2017.
Médium: Luciano C.